15 de maio de 2011

Críticas de Consumo #1 - Os 39 Degraus

Esta tarde, após uma muito atribulada compra / venda / doação de bilhetes, estive com uma Tia de Bellém-Sintra e com um Radiólogo de eleição no teatro Villaret, em Lisboa, ali ao pé do metro das Picoas, mais ou menos a meio para quem desce do Saldanha até ao Marquês e também mais ou menos a meio para quem sobe. A peça chamava-se Os 39 Degraus, uma adaptação de um musical da Broadway que por sua vez era adaptação do filme de Hitchcock cuja trailer passo em seguida, para visionamentalização, digo, visionamentalizacionamento, de quem achar por bem:


Ora digamos que este filme envelheceu tão bem como um pacote de vinho tinto Encosta da Serra (daqueles que os mais incautos poderiam confundir com um litro de leite), após ser deixado sob temperaturas desmesuradamente quentes durante 50 anos.


Por isso mesmo, e porque não é fácil imaginar um thriller de Hitchcock adaptado em musical da Broadway, entrámos no teatro com a sensação desconfortável de quem tinha pago 1 euro por garrafinhas minúsculas de água que no supermercado custam 10 cêntimos. Não, esperem - isso aconteceu mesmo. No bar do teatro, as garrafinhas minúsculas de água custam mesmo 1 euro. A sensação desconfortável era mais relacionada com a incerteza perante o que iríamos encontrar, e também com os bancos horrorosamente quentes aconchegantes numa sala em que estava um calor pavoroso uma agradável temperatura de verão.




Desminto desde já que eu iria gostar de toda e qualquer coisa em que entrasse a Inês Castel-Branco. Isso é mentira. Por exemplo, ela entrava nos Batanetes e eu não gost... ... peço desculpa, distraí-me a olhar para a imagem ao lado. Onde é que eu ia mesmo?
Ah, sim. A peça.





Os 39 Degraus é uma produção totalmente insana e alucinante da responsabilidade de Pedro Costa e Paulo Sousa Costa e encenação de Cláudio Hochman. A história conta-se em poucas palavras: Richard Hannay (Joaquim Horta) é um rico e entediado playboy inglês que, num teatro, conhece Anabela Scmidt (Inês Castel-Branco), uma estrangeira perigosa e sedutora, que lhe pede auxílio para fugir aos dois espiões (João Didelet e Rui Melo) que a perseguem. Anabela acaba por ser assassinada, e Richard vê-se como principal suspeito de um crime que não cometeu. Começa aí o hilariante jogo de gato-e-rato, em que Richard vai ter de arriscar tudo para provar a sua inocência.


A história não é mais do que um pretexto (e que belo pretexto!) para uma sequência inacreditável de piadas certeiras, gags visuais e sonoros e muitas, muitas gargalhadas, numa viagem a 200 à hora por entre cenários minimalistas e personagens pitorescas. O ritmo é tal que as mais de 2 horas de duração da peça passam a correr, sem sequer um momento monótono para podermos apontar alguma falha no guião. Inês Castel-Branco, encantadora como sempre, saltita alegremente entre as personagens de comum secretária, russa sedutora ou campónia oprimida. Joaquim Horta é competente como anti-herói corajoso com jeitinho para conquistar o coração feminino. Mas o espectáculo dentro do espectáculo é a dupla Didelet/Melo. Trocando de personagem a um ritmo alucinante, interpretam os papéis de espiões, polícias, mestres de cerimónia de um espectáculo de adivinhação que fede a ranço e a uísque de má qualidade, donos de motel na Escócia profunda, vilões, pedras num rio (!!!) e vários outros, sempre com um carisma e uma dinâmica em palco impressionantes. A "Quarta Parede" leva uma tareia memorável, e os tresloucados cenários e efeitos sonoros compõem o resto do quadro que, de frenética pincelada em frenética pincelada, vai sendo pintado à nossa frente, numa história contada com mestria e muito, muito humor.
E cuidado com o caruncho, que é um perigoso bicho devorador de mobília!

Veredito:
Os 39 Degraus é um festival de gargalhadas desde o inesperado monólogo de abertura em voz-off até à conclusão final, que merece uma ovação de pé. Leva a classificação de 5 Alphas e o Selo Alpha de Qualidade.


     /5

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